Apple x Samsung – O que causou o maior conflito do mundo dos negócios?

“Eu vou gastar meu último suspiro se eu precisar, e vou gastar cada centavo dos US$40 bilhões da Apple no banco para corrigir esse erro. Vou destruir o Android, porque é um produto roubado. Estou disposto a ir à guerra termonuclear para isso”.

Esse é um trecho de uma entrevista dada por Steve Jobs, em março de 2010, ao jornalista Walter Isaacson. Pouco mais de 1 ano depois começaria uma batalha sem precedentes na história dos negócios.

Em abril de 2011, a Apple entrou com um processo contra a Samsung, alegando quebra de patentes, marcas comerciais, interface do usuário e design. No mesmo mês, a Samsung entrou com um processo contra a Apple, alegando quebra em patentes na comunicação móvel.

Desde então, a guerra custou bilhões de dólares e se expandiu para quatro continentes.

Mas qual foi o gatilho que iniciou essa briga? Descubra a história do projeto super-secreto desenvolvido pela Apple, e como a Samsung conseguiu dobrar seu valor de mercado nos últimos 5 anos por causa dele.

Esse é mais um de uma série de estudos de caso que estou escrevendo e o primeiro que foca em uma disputa entre duas empresas. Se gostar, aproveite para ler o que fiz sobre o Uber – uma possível pirâmide ou algum dia a empresa ainda terá lucro? Tem alguma sugestão para a próxima empresa a ser analisada? Diga nos comentários!

 

Como tudo começou

Em agosto de 2010 um grupo de executivos da Apple invadiu o escritório central da Samsung em Seul, na Coréia do Sul. Isso aconteceu pouco após a Samsung lançar o Galaxy S, seu novo competidor no mercado de smartphones.

Os designers da Apple analisaram cuidadosamente o aparelho e chegaram à conclusão de que era uma cópia pirata do seu iPhone. Tanto a aparência (tela, ícones e até a caixa) quanto características patenteadas como o “deslize para desbloquear” eram idênticos ao celular da empresa americana.

Durante anos, a Apple havia trabalhado e investido milhões de dólares projetando atributos inovadores para o iPhone. Os executivos ficaram surpresos ao verem que sua fornecedora havia roubado seu design e muitas das suas características.

Porém, ao convocarem o presidente da Samsung, Jay Y. Lee, para explicar a situação, não receberam uma resposta satisfatória. Após semanas de enrolação, Jobs decidiu tomar providências pessoalmente, se dirigindo para a capital sul coreana.

A resposta que tiveram lá não foi agradável.

“Como vocês ousam nos acusar de piratear o iPhone? Nós temos produzido celulares há décadas e possuímos nossas próprias patentes. Inclusive, a Apple provavelmente deve estar violando algumas” – disse o vice-presidente da Samsung, Seungho Ahn.

A mensagem era clara: se a Apple entrasse na justiça contra a Samsung, rapidamente receberia um processo de volta.

Nos anos que se seguiram, a situação entre as empresas escalou de forma exponencial. Nunca houvera um conflito tão grande no mundo dos negócios, o que acabou por custar bilhões de dólares, produziu milhões de páginas de processos, além de diversos vereditos, apelações e audiências.

 

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O misterioso Projeto Roxo da Apple

A maior aposta da Apple foi desenvolvida em uma sala roxa que havia na sua sede. Lá, alguns funcionários passaram a desenvolver, em 2004, um celular que tivesse internet, email e diversas outras características que outros celulares não possuíam.

Durante anos executivos tentaram fazer com que Jobs investisse nessa ideia. Mas ele tinha vários motivos para achar que não daria certo. Foi só quando a Apple desenvolveu uma tela de vidro que possibilitaria controle por toque que o projeto foi aceito.

Mas o requisito principal era o segredo. A Apple já era conhecida como inovadora e, se os competidores soubessem que ela estava projetando um celular, eles iriam trabalhar em novos designs para seus aparelhos.

Ninguém na empresa poderia saber sobre o Projeto Roxo. Os funcionários chamados para trabalhar nesse projeto eram abordados com extrema cautela e sequer sabiam sobre o que se tratava. Então eram levados para a sala roxa que, em determinado ponto, cresceu tanto que para se chegar à um determinado laboratório de computadores era necessário passar por quatro portas trancadas à chave.

Na porta da sala havia um cartaz com uma referência ao filme Clube da Luta, de 1999: “a primeira regra do Clube da Luta é que ninguém pode falar do Clube da Luta”.

Finalmente, em janeiro de 2007, Steve Jobs fez a grande apresentação na conferência anual da Macworld. Nós vamos fazer história juntos hoje! – disse ele sob aplausos – Este é o dia que venho esperando há dois anos e meio.

“Hoje iremos introduzir três produtos revolucionários: um iPod com controle por toque, um celular e um dispositivo para comunicação na internet. Vocês estão entendendo onde quero chegar? Mas não são três aparelhos separados. É um único, chamado de iPhone”.

Muitos criticaram a ideia e não acreditaram que iria dar certo.

“É apenas mais um entre as dezenas de opções em um mercado cheio de escolhas para os consumidores” – Jim Balsillie, CEO da BlackBerry.

“Não existe chance de o iPhone conseguir uma fatia significativa do mercado. Sem chances!” – Steve Ballmer, CEO da Microsoft.

No começo, essas previsões pareciam que estavam certas. Nos nove primeiros meses, as vendas foram a metade do previsto por Jobs. Mas, no quarto trimestre de 2007, elas dispararam com o lançamento do iPhone 3G. A demanda foi tão alta que a Apple não conseguiu repor os estoques a tempo. Ao final de 2009 já eram mais de 30 milhões de unidades vendidas. A Apple, começando do zero, chegara a 16% do marketshare, se tornando a terceira maior empresa do ramo de celulares.

Enquanto isso, no final de 2009, a Samsung não tinha nada para comemorar. Ela sequer estava entre as 5 maiores. Em um relatório dos marketshares, desenvolvido pela IDC, a empresa estava na categoria “demais marcas”.

A Samsung realmente copiou o iPhone?

Fundada em 1938 como uma empresa de comércio de peixes e vegetais, a Samsung entrou no mercado de eletrônicos no fim da década de 1960.

Não raro ela utilizava a estratégia de produzir versões mais baratas de eletrônicos inovadores lançados por outras empresas. Isso fez com que, durante a década de 90, ganhasse uma reputação de vender produtos baratos e de 2ª linha.

Mesmo assim, através de acordos ilegais de fixação de preço com seus concorrentes, seus executivos encontraram uma forma de fazer os lucros da empresa crescerem. Mesmo com a descoberta dos esquemas, tornou-se a maior empresa da Coréia do Sul.

Só nos últimos 10 anos, seu valor de mercado cresceu mais de 200%. E parte disso pode ser explicada pela briga com a Apple, que fez com que a empresa se alavancasse tanto.

Mas será que realmente o Galaxy S foi uma cópia pirata do iPhone?

Praticamente não há dúvidas de que houve, de fato, a reprodução. Em 2012, a Samsung chegou a perder o processo, recebendo uma pena de US$1 bilhão, que, posteriormente, foi reduzida para US$890 milhões em 2013. Entretanto, o valor da multa não foi nem 50% do que a Apple pediu. Com isso, a briga ainda continua.

A questão é se realmente a reprodução foi algo grave, ou não. Afinal, diversos itens que foram reproduzidos eram muito simples. Além disso, no mercado de eletrônicos sempre há uma empresa líder e outras que a seguem. A própria Apple já havia sido processada por outras empresas como a Nokia. É algo relativamente comum nesse mundo.

essa foi a intenção da Samsung desde o começo. Não seria a primeira vez que ela teria sido acusada de plágio. Pelo contrário, a tática de infringir uma patente e processar de volta ao ser processada foi utilizada diversas vezes pela empresa.

A versão da sul-coreana foi que, como a Samsung era a maior detentores de patentes do mundo, é normal que outras empresas utilizem suas patentes. Mas ela optaria por somente processar as concorrentes caso fosse atacada primeiro.

Por outro lado, ex-advogados e algumas outras testemunhas ouvidas nas audiências dizem que não é bem assim. “Não existe patente no mundo que ela não gostaria de usar, independente de quem seja” – afirmou Sam Baxter, um advogado de patentes que defendeu a empresa certa vez.

De qualquer forma, a realidade é que, apesar da enorme pena decretada, o litígio foi benéfico para a Samsung e prejudicial para a Apple. Durante anos, a primeira dominou consideravelmente o mercado de smartphones. Ao final de 2016, embora a Apple tenha se aproximado, a dominância do mercado ainda era da fabricante coreana.

O Galaxy, um produto “igual ao iPhone, só que mais barato”, foi um sucesso de vendas.

 

A estratégia do contra-ataque aniquilador

Quando a Samsung processou a Apple, após ser processada inicialmente, não foi a primeira vez que isso aconteceu. Na verdade, isso fazia parte de uma estratégia cuidadosamente orquestrada.

Ao ser flagrada por quebra de patente, o passo inicial era enrolar o máximo possível para dar uma resposta. Quando finalmente processada, entrava com um processo contra sua acusadora, alegando que esta também havia quebrado sua patente.

Desse modo, o litígio demorava anos e, mesmo tomando multa, a Samsung já estava inserida no mercado, muitas vezes, com um marketshare muito acima do que o da detentora original das patentes.

Foi o caso da Sharp, poucos anos antes da Apple. Em 2007, a empresa de eletrônicos japonesa processou a sul-coreana por uma quebra na patente da tela de LCD. Porém, ao final de 2009, mesmo sofrendo derrota, a Samsung já dominava 24% do mercado de televisores LCD, enquanto a Sharp possuía apenas 5%.

Antes da Sharp, foi a vez da Pioneer, outra japonesa especializada em eletrônicos, detentora da patente de televisão de plasma. A batalha durou 3 anos. Mesmo vencendo, já era tarde demais para a Pioneer, que teve que fechar suas operações de aparelhos televisores, demitindo 10 mil funcionários.

O mesmo aconteceu com outras empresas como a Kodak. Nem a InterDigital, uma pequena empresa do interior dos Estados Unidos, escapou de ter suas patentes violadas.

Esse modelo de negócios vinha dando certo até sofrer um choque quando a Apple introduziu o iPhone. A Samsung não estava preparada para uma tecnologia tão avançada e nem para um adversário tão poderoso.

 

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A lição que Steve Jobs deixou antes de morrer

A venda de celulares da Samsung não era ruim. Porém, após o surgimento dos smartphones no mercado, a empresa simplesmente não conseguiu mais ser competitiva. O iPhone foi a gota d’água.

Ela estava projetando muitos celulares diferentes, porém todos com uma qualidade baixa. E esse foco na quantidade, em vez da qualidade, não estava dando certo.

O caminho para melhorar a qualidade passava por eliminar processos ineficientes e reduzir o número total de modelos. O importante era colocar no mercado um aparelho de alto nível e não vários modelos de baixo nível.

Até então, o exemplo seguido pela empresa era o da Nokia, outra que não estava conseguindo competir com os smartphones. Foi aí que os olhos da Samsung se voltaram para a Apple. Desenvolver o seu próprio iPhone passou a ser o objetivo.

Durante meses, uma equipe desenvolveu o novo smartphone em um ritmo alucinante. Alguns funcionários dormiam 3 horas por noite. Terminado o protótipo, executivos viram que tinha vários pontos negativos, se comparado ao iPhone.

Foi aí que o processo de cópia começou. Pedaço a pedaço, o smartphone da Samsung ia ficando cada vez mais parecido com o da Apple. Tão parecido que alguns executivos chegaram a se preocupar com as similaridades. Mas apenas algumas mudanças foram feitas para diferenciar o Galaxy do iPhone.

A sensação na Apple, claro, foi de que haviam sido roubados. Não era para menos, uma vez que foram anos de planejamento intenso.

A verdade é que, após uma grande batalha jurídica, em diversos continentes, houve um desgaste muito grande para os envolvidos. Um ex-executivo da Apple afirmou, em certa ocasião, que a briga foi péssima tanto emocionalmente como financeiramente.

Paralelamente, a Samsung assimilou a tecnologia e passou a desenvolver a sua própria. Hoje já é uma grande competidora no ramo.

Steve Jobs, que morreu 1 ano após declarar que gastaria o último suspiro na batalha contra o Android, deixa uma lição importante para todos nós:

“Eu olho todos os dias no espelho e pergunto a mim mesmo: se esse for meu último dia de vida, eu iria querer fazer o que farei hoje? Sempre que a resposta for ‘não’ durante muitos dias seguidos, há algo que eu preciso mudar”.

Certamente, se ele pudesse voltar atrás, teria feito muitas coisas de outra maneira.

 

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